sexta-feira, 4 de julho de 2025

Poema — Ardor do Carmelo




Poema — Ardor do Carmelo

Nas montanhas altas e frias do tempo,
Silêncio e solidão teciam o alento.
Ali viviam, em paz e oração,
Eremitas do Carmelo, com firme vocação.

Homens e mulheres, unidos no véu,
Clausura selada, promessas ao Céu.
Rostos velados, almas tão puras,
Ofereciam ao mundo suas dores mais duras.

Onze anos de céu na terra escondida,
Monastério, altar, a vida oferecida.
Com um bispo, irmãos, e irmãs ao redor,
Ali repousava o zelo maior.

Mas o mundo, cruel, rompeu os portões,
Tomou-lhes as casas, quebrou os padrões.
Sem abrigo, sem mitra, sem pão,
Restou-lhes apenas o Deus da unção.

Foram lançados, dispersos no chão,
Com nada na mão — mas com fogo no coração.
Reconstruíram, tornaram a erguer,
Mas de novo vieram e fizeram doer.

Onde repousam agora o filhos do Carmelo?
Onde escondem em seu peito o ardor sacro e belo?
Não há telhado, nem chão garantido,
Mas há o Céu — e um zelo infligido.

Sim, a luta persiste, não cessam jamais,
Pois vivem a chama dos tempos profetais.
Elias, o forte, um dia chorou,
Mas ergueu-se e andou — e o mal enfrentou.

Descansaram um tempo, agora é a hora,
A batalha começa, e o mundo devora.
O anticristo avança com engano e riso,
Mas eles combatem com o Cristo indeciso.

Não por glória, nem fama, nem voz,
Mas porque Deus caminha com eles — e em nós.
Carmelitas da montanha, sem rosto ou brasão,
São tochas acesas na escuridão.

E a casa deles? Talvez nunca se veja.
Mas cada coração que ora — é uma igreja.
E onde descansam? Em Cristo, na cruz.
Pois o Carmelo não morre… ele arde em Jesus.

Matheus Lino


quarta-feira, 2 de julho de 2025

Entre o Direito e o Presente: A Arte de Agradecer as Coisas Boas da Vida

 


Entre o Direito e o Presente: A Arte de Agradecer as Coisas Boas da Vida

Há fotos que parecem pequenos fragmentos da modernidade. Esta é uma delas. Olavo de Carvalho, de pé à porta de seu trailer, sob o céu límpido e as folhas douradas de um outono americano, carrega em sua expressão o peso de quem muito viveu, muito leu e, sobretudo, muito pensou. A imagem parece silenciosa, mas ecoa uma pergunta que atravessa os séculos:  Como você encara as dádivas da vida? Como um direito conquistado… ou como um presente inesperado?

No dia 7 de junho de 2017, Olavo publicou nas redes sociais uma frase que resume, com a precisão de um ferreiro de palavras, essa tensão existencial:

“Tudo depende de saber se você desfruta das coisas boas da vida como quem exerce um direito ou como quem recebe um presente.”

Essa sentença tem cheiro de café passado, de livro antigo aberto numa tarde de sábado, de conversa de varanda quando o sol já vai se pondo. Ela nos chama de volta para uma postura interior que, nos tempos modernos, parece cada vez mais rara: a gratidão despretensiosa.

Vivemos hoje num mundo onde o vocabulário dominante é o da "autenticidade dos desejos" e da "realização pessoal a qualquer custo". Somos educados para a exigência da vida, como se ela fosse um contrato em cartório. Queremos garantias, direitos, bônus e reembolsos emocionais. Quando algo bom acontece, parece apenas uma pequena correção de um certo desequilíbrio cósmico que exige ter felicidade.

Mas a vida – essa velha senhora que tem mais humor do que justiça – não opera assim. Ela distribui suas graças como uma criança distraída joga flores pelo caminho. Há quem saiba recolho-las com as mãos trêmulas de gratidão. Há quem pise nelas, correndo atrás de algo que nunca chega.

Olavo, com seu olhar de filósofo que morou nas duas extremidades da miséria e da contemplação, nos provoca a pensar: Você está vivendo como credor da existência ou como um convidado inesperado numa festa que nunca sonhou estar?

Quem vive como credor nunca sorri de verdade. Está sempre calculando o que falta. Já quem vive como convidado… esse ri com os olhos, com os ombros, com a alma inteira. Sabe que cada pôr do sol, cada amizade sincera, cada xícara de café quente, é um pedaço de eternidade entregue de bandeja.

A escolha é sua.

Que essa imagem e essa frase fiquem gravadas como um lembrete simples, mas duro como pedra: a vida não deve nada a ninguém. Tudo está presente. Tudo é graça.



terça-feira, 1 de julho de 2025

O Silêncio que Cura: Um Encontro com a Misericórdia

 


O Silêncio que Cura: Um Encontro com a Misericórdia

Em um canto discreto de uma igreja antiga, paredes gastas pelo tempo, o reboco rachado testemunha mais histórias do que qualquer livro. A cena é simples, mas carregada de significado eterno: um homem ajoelhado diante de um sacerdote, em confissão.

Do lado de fora, o mundo corre frenético, impaciente, barulhento. Aqui dentro, reina um silêncio denso, quase palpável, como o intervalo entre o trovão e a chuva. Não há tecnologia, não há microfones, não há hashtags. Apenas duas almas: uma que carrega o peso das próprias misérias, e outra que, com estola roxa e mãos calejadas por muitas absolvições, oferece o ouvido, o conselho e, por fim, as palavras de redenção.

Quantos anos de culpa traz aquele penitente? Quantas noites mal dormidas? Quantas promessas de mudança adiadas? Agora, tudo se resume a uma sugestão, um fio de voz, dito talvez entre lágrimas ou com um sorriso envergonhado. O confessionário — ainda que improvisado — é um pequeno tribunal da misericórdia, onde a sentença é sempre a mesma: "Ego te absolvo...".

A imagem é um lembrete para o homem moderno, tão acostumado a racionalizar os próprios erros e terceirizar a culpa. No confessionário, não há espaço para desculpas ensaiadas. Ali, cada palavra tem o peso de um tijolo no muro que separa a alma de Deus. E cada absolvição é um pedaço desse muro que se desaba, abrindo novamente caminho para a graça.

Os antigos sabiam disso. Por isso ajoelhavam-se com humildade, como quem sabe que está diante de um mistério maior que a própria vida. Hoje, muitos fogem da confissão, inventando teologias caseiras para justificar a ausência. Mas a verdade é dura como pedra de altar: só há um caminho para a reconciliação sacramental, e passa por esse ato concreto de humilhação e confiança.

Talvez o que mais nos incomode nessa imagem não seja o constrangimento de contar os pecados, mas uma lembrança de que, apesar de todos os nossos discursos progressistas, ainda somos feitos da mesma massa frágil dos nossos avós. Pecadores por natureza. Dependentes da misericórdia.

Que esta cena nos provoque, nos incomode e, acima de tudo, nos mova. Que o próximo banco de madeira seja o nosso. Que o próximo silêncio denso seja o que antecede a nossa própria absolvição.

Porque, no fim, a maior liberdade não está em fugir de Deus… mas em voltar para Ele.


Poema — Ardor do Carmelo

Poema — Ardor do Carmelo Nas montanhas altas e frias do tempo, Silêncio e solidão teciam o alento. Ali viviam, em paz e oração, Eremitas...