Ontem fui ao shopping. Era véspera do Dia dos Namorados. Estava tudo impecavelmente decorado, corações suspensos como frutas em árvores artificiais, músicas melosas tocando no sistema de som e filas nas lojas de perfumes, chocolates e bichinhos de pelúcia. Um cenário cuidadosamente construído para nos fazer sentir que o amor está no ar — ou, pelo menos, no cartão de crédito.
Observei. Senti-me num banco qualquer, como quem assisti a uma peça antiga encenada com novos sensores, mas o mesmo roteiro gasto. Vi casais trocando presentes, jovens e não tão jovens com sacolas coloridas, embalagens de luxo, beijos apressados, selfies ensaiadas. E, no entanto, não vi compromisso.
Vi o mimo. Mas não vi o “sim”.
Vi alianças de prata, mas sem intenção de selar alianças eternas.
Vi o esforço para agradar, mas nenhum esforço para construir juntos uma vida.
Ninguém falou de casamento. Ninguém mencionou seus filhos. Vi paixões intensas, mas passageiras como as vitrines que, em quinze dias, já oferecem vendendo outro feriado qualquer. Vi “relacionamentos” que parecem contratos de locação: sem multa para quem quiser sair a qualquer momento.
Senti um aperto no peito. Não por amargura — Deus me livre disso — mas por uma profunda compaixão por essa geração que aprendeu a chamar de "liberdade" aquilo que é, na verdade, medo disfarçado de autonomia. Medo de doar-se por inteiro, medo de prometer, de sacrificar, de morrer para si mesmo para fazer o outro viver. O amor, hoje, não quer cruz.
Estamos numa crise. Não de consumo — esse vai muito bem, obrigado. Mas de significado. O amor virou performance, e o romantismo uma estética sem substância. Os gestos continuam: flores, jantares, mensagens. Mas o sentido que os sustentava — o desejo de construir um lar, de educar filhos, de envelhecer ao lado de alguém — esvaneceu-se.
Não sou contra o namoro. Pelo contrário. É uma bela escola do amor. Mas um namoro sem rumor, sem vocação à totalidade, torna-se apenas um passatempo. E o amor não é passatempo. É vocação. É projeto. É semente lançado no solo com a esperança de frutos — não apenas flores.
Enquanto isso, seguimos vendendo casais sorrindo para selfies, mas fugindo da entrega. Fazendo juras, mas evitando votos. E por isso nossa sociedade se desmancha em relações opostas como os papéis de presente desempenhados nas lixeiras ao fim do dia.
Que o próximo Dia dos Namorados não seja apenas mais um episódio da novela "Amores de Aparência", mas um convite a redescobrir o que é amar de verdade: com coragem, com fidelidade, com abertura à vida. Com aliança no dedo e no coração.
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