quinta-feira, 22 de maio de 2025

Filosofar é Aprender a Morrer: Por que pensar é um Ato Revolucionário

 

Filosofar é Aprender a Morrer: Por que pensar é um Ato Revolucionário

No coração da filosofia há uma verdade desconcertante, daquelas que não se aprende nos manuais ou nos salões acadêmicos polidos: filosofar é, essencialmente, aprender a morrer. Esta máxima, atribuída a Sócrates e retomada com vigor por Montaigne, pode parecer um devaneio fúnebre aos ouvidos modernos. Afinal, quem deseja viver pensando na morte? No entanto, é justamente nessa tensão entre a vida e a morte que se encontra o poder revolucionário do pensamento.

Em uma sociedade que evita a morte como se fosse uma falha do sistema, filosofar se torna um ato de rebeldia. Vivemos rodeados por distrações, anestésicos emocionais, entretenimentos que nos prometem tudo, menos o confronto com a finitude. Pensar, nesse contexto, é desobedecer. É virar o rosto para o barulho e olhar de frente aquilo que todos evitam: o fato de que somos mortais.

Filosofar é treinar o espírito para não temer aquilo que é inevitável. É viver como quem já aceitou o fim e, por isso mesmo, se liberta do medo. Um homem que aprendeu a morrer não é facilmente manipulável. Ele não corre atrás de ídolos, não se curva diante do poder, não vive como escravo dos desejos passageiros. Ele pensa — e isso basta para ser perigoso num mundo que prefere a repetição à reflexão.

Pensar profundamente é subversivo. Por isso, em todas as épocas, os verdadeiros filósofos foram desconfiados pelos sistemas de poder. Sócrates foi condenado à morte não por blasfemar os deuses, mas por ensinar jovens a pensar. Nosso Senhor Jesus Cristo foi crucificado por questionar a lógica do poder e expor a hipocrisia dos líderes religiosos. Giordano Bruno foi queimado por recusar-se a calar o que pensava. Pensar é romper com a superfície. É mergulhar no abismo. É ter coragem de perguntar o que todos aceitam sem pensar.

E aqui está o centro da revolução filosófica: o pensamento autêntico não é funcional, não visa agradar, não se curva ao politicamente correto nem às modas intelectuais. Ele incomoda porque revela. Ele fere porque purifica. Ele destrói ídolos e constrói fundamentos.

Filosofar não é apenas argumentar ou escrever tratados. É, antes de tudo, silenciar. É calar as vozes do mundo para ouvir a própria alma. Em uma época onde todos têm opinião, mas poucos têm pensamento, o filósofo é aquele que, em vez de reagir, contempla. Em vez de gritar, escuta. Em vez de julgar, compreende. O silêncio do filósofo grita mais alto do que os discursos ideológicos, porque ele vem da interioridade, não da vaidade.

Este silêncio nos conduz à contemplação da verdade, que é sempre simples, mas nunca superficial. E ao se aproximar da verdade, o filósofo percebe que toda a vida é preparação para a morte. Não a morte biológica apenas, mas aquela outra morte — a do ego, da ilusão, do apego às máscaras.

Por isso, filosofar é revolucionário. Mas não uma revolução de massas, e sim de consciências. Uma revolução que começa no interior e se irradia. Quando um homem aprende a morrer, ele aprende a viver de verdade. Ele não tem mais medo de ser sincero, de amar com profundidade, de renunciar ao que é fútil. Ele é, finalmente, livre.

E um homem livre não pode ser controlado.

Pensar, portanto, é perigoso. Não porque destrói, mas porque revela. Revela que muito do que chamamos de progresso é fuga. Que muito do que chamamos de felicidade é anestesia. Que muito do que chamamos de fé é superstição. O pensador é aquele que, com humildade e coragem, se lança no deserto do real e ali encontra a Verdade, que é sempre ferida antes de ser cura.

Filosofar é morrer para o mundo das aparências, e nascer para o mundo do ser. É aceitar o martírio cotidiano de quem pensa, ama e espera — sem ilusões, mas com esperança. Por isso, filosofar será sempre, antes de tudo, um aprendizado da morte, para que possamos enfim viver.


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