Nos tempos dos Padres da Igreja, o bispo era o pobre entre os pobres, o servo dos servos, o mártir que ascendia ao trono episcopal pela via do sangue, não do prestígio. Mas hoje, entre palácios, jatinhos e relógios suíços, será que ainda resta algo daquela glória verdadeira que passa pela cruz?
Um nome salta aos olhos nesse contraste escandaloso: Patriarca Cirilo I (Kiril) , líder da Igreja Ortodoxa Russa, homem de vestes sagradas — mas esses passos parecem ecoar mais o tilintar do ouro do que o silêncio da oração.
Em 2012, uma fotografia oficial publicada no site do Patriarcado mostrou Kiril sentado, em aparente sobriedade. Nada mais, até que os internautas notaram um detalhe perturbador: o reflexo na mesa polida mostrou um relógio caríssimo no pulso do patriarca, mas o objeto havia sido apagado da imagem .
O modelo? Um Breguet de 30 mil dólares , acessório mais comum em príncipes do Golfo do que em sucessores dos Apóstolos. A edição da imagem foi confirmada. Uma justificativa? "Erro técnico." Mas o símbolo ocorre: um reflexo que diz mais do que mil palavras.
A Igreja Ortodoxa Russa, sob o comando de Kiril, tornou-se um braço ideológico do Kremlin , oferecendo sustentação religiosa ao projeto imperial de Vladimir Putin. O patriarca chegou a declarar que a guerra contra a Ucrânia tinha um “valor espiritual”, um combate contra os “valores decadentes do Ocidente”.
Não é apenas retórico. O Patriarcado desfruta de isenções fiscais, propriedades milionárias, envolvimento indireto com negócios de petróleo e tabaco , e uma influência cultural que remonta à antiga simbiose entre o trono e o altar no Império Bizantino.
Mas o preço é alto. Quando a fé se torna instrumento do Estado, ela se corrompe. O altar deixa de ser lugar de sacrifícios, e passa a ser palco de conveniências.
Contrastemos essa figura com os verdadeiros pastores da Igreja: São João Crisóstomo , exilado e perseguido por denunciador a luxúria do clero; Santo Inácio de Antioquia, devorado por leões por amor a Cristo; São Basílio Magno, que rejeitou privilégios e viveu entre os pobres.
Estes não vestiam ouro nem calçavam sapatos italianos. Vestiam o sofrimento do povo, calçavam a poeira da estrada. E por isso deixaram rastros eternos.
Não se trata aqui de atacar a Ortodoxia — tradição venerável e irmã na fé, guardiã de tesouros litúrgicos e espiritualmente inestimáveis. Mas sim de clamar, como o profeta:
"Ai dos pastores que se apascentam a si mesmos!" (Ez 34,2)
O escândalo não é só no luxo. Está na incoerência. Está em ver um sucessor dos apóstolos viver como um oligarca, enquanto o povo fiel jejua, reza e clama por líderes santos.
O reflexo do relógio na mesa do patriarca tornou-se símbolo de uma Igreja que talvez não brilhe mais com a luz de Cristo, mas apenas reflete a vaidade deste mundo .
A nós, católicos orientais, cabe aprender com esse drama. Que tipo de pastores formamos? Que tipo de Igreja temos sustentada? Estamos mais preocupados com a cruz ou com a prestígio?
O verdadeiro ouro da Igreja é a santidade. Tudo o mais é vaidade, poeira e escândalo.
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